Jair Bolsonaro reclamou por ter sido “esculachado” pelo decano do STF, Celso de Mello, no voto contra a reedição da Medida Provisória que transferia da Funai para o Ministério da Agricultura a demarcação de terras indígenas.
Celso de Mello disse pouco e, se não fosse a autocontenção a que um juiz está (ou deveria estar) obrigado poderia dizer mais, muito mais, depois das “explicações” mentirosas e covardes que Bolsonaro deu sobre o caso.
Em primeiro lugar, não houve uma distração: o debate que levou à recusa da primeira MP foi intenso e teve a participação direta do Planalto. Portanto, ninguém estava distraído em apresentá-la outra vez, ao ser rejeitada.
E, logo em seguida, não poderia continuar distraído, porque o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, devolveu-a pelo mesmo motivo óbvio e textual: “por ofensa ao art. 62, § 10, da Constituição Federal.” Bastaria revogá-la para que a ação no Supremo perdesse o objeto.
Depois, não é possível que alguém, ainda mais quem passou 28 anos na Câmara, onde as MPs são apreciadas não saiba que é inconstitucional reapresentar matéria já rejeitada. Aliás, é obvio, porque, do contrário, um presidente poderia passar o governo inteiro com uma legislação que não tem concordância do parlamento.
“Foi minha assessoria” é de uma pusilanimidade sem par, mesmo que ele diga que, afinal, tem culpa por ter assinado.
No Palácio, na Casa Civil e no Ministério da Economia – cujos ministros assinam o texto com o Presidente – há competente assessoria jurídica que jamais cometeria este erro, salvo se recebesse ordem para isso (e olhe lá). Aliás, é estranho que entre os signatários da MP não esteja Sérgio Moro, uma vez que a Funai voltou a pertencer ao Ministério da Justiça.
Por onde que que se olhe, vê que Bolsonaro mente e reeditou a medida de “caso pensado”, seja por acreditar que passaria mesmo assim, seja para criar uma crise e marcar posição contra a demarcação de terras indígenas.
Portanto, nem que Celso de Mello chamasse a atitude de “moleque” estaria esculachando o presidente.
De resto, algo desnecessário, pois ele próprio se esculacha.
FERNANDO BRITO ” BLOG TIJOLAÇO” ( BRASIL)