O Conversa Afiada acompanhou, ao longo de toda esta terça-feira, 2/VII, o depoimento do ministro da Justissa, Sergio Moro – o Conge – à Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados sobre as revelações, feitas pelo Intercept, que lançam luz sobre a organização criminosa que se formou na Republica Nostra de Curitiba.
A sessão terminou por volta das 21h40, quando Moro deixou a comissão aos gritos de “fujão” e “ladrão”.
Foi quando o deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) disse:
“O senhor vai estar sim nos livros de história, vai estar como um juiz que se corrompeu, com um juiz ladrão. É isso o que vai estar nos livros de história”.
Deputados bolsonários se irritaram e foram para cima de Glauber.
Em meio à confusão, o Conge saiu por uma porta lateral.
Veja a transcrição não-literal das principais intervenções da Oposição e as principais respostas (sic) do ministro (sic):
Moro – explanação inicial:
- há uns dois meses fui informado de que hackers teriam invadido celulares de procuradores da força-tarefa. No dia 4/VI, houve uma tentativa de ataque ao meu celular. Eu tinha utilizado o Telegram, mas o deixei em 2017, quando surgiram aquelas informações sobre tentativas de hackeamento nas eleições americanas. A informação que tivemos é que, seis meses depois de sair do Telegram, todas as mensagens seriam apagadas, inclusive na nuvem.
- a minha opinião é que alguém com muitos recursos está por trás dessas ações, para invalidar condenações da Operação Lava Jato e evitar o prosseguimento das investigações
- há notícias de que meu telefone foi usado por hackers para fazer brincadeiras. Também de que esse hacker interagiu com um conselheiro do Ministério Público.
- afirmei desde o início que são supostas mensagens. Não reconheço a autenticidade dessas mensagens. Algumas podem ser minhas, algumas podem ter sido adulteradas parcial ou totalmente. Obersevei, no entanto, que essas mensagens foram divulgadas com grande sensacionalismo e deturpação do sentido por esse site [Intercept].
- ex-Ministro do STF Carlos Velloso disse que as mensagens não tinham nada de ilícito
- é comum que juízes falem com procuradores e advogados
- eu sempre agi com correção, com base na lei e na imparcialidade, sem qualquer espécie de desvio
- a Lava Jato mudou o padrão de impunidade no Brasil
Professora Marcivania (PCdoB-AP), presidente da Comissão de Trabalho:
- ninguém nesta Casa tem predisposição contra sua pessoa. O que nos interessa aqui não é a suposta ilegalidade na obtenção das mensagens, mas se as informações que lhe dizem respeito são verdadeiras ou não. Os grupos de trocas de mensagens existiram ou não? O senhor traz documentos para corroborar suas respostas?
- os veículos que estão divulgando as trocas de mensagens o fazem relacionando as conversas a fatos, eventos que corroboram o conteúdo
- em que país democrático um jornalista que obtém informações de interesse público é obrigado a denunciar as suas fontes?
- o modo como foi conseguida a informação não é responsabilidade do jornalista, mas verificar se ela é verdadeira. A questão central é aferir se o teor das mensagens é verdadeiro. Se for, não há como achar normais tais violações, crimes gravíssimos
- se a autenticidade desses diálogos se confirmar, Vossa Excelência colocou a pó o Código da Magistratura
- é contrassenso usar método corrupto para lutar contra a corrupção
Helder Salomão (PT-ES), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias:
- vou narrar alguns fatos: em março de 2016, o senhor determinou a condução coercitiva de Lula, sem que ele tivesse sido previamente chamado a depor; no mesmo mês, divulgou gravações travadas entre Lula e Dilma Rousseff, violando as leis brasileiras sobre a competência do STF; em dezembro de 2016, participou de evento da revista Istoé, quando confraternizou com adversários políticos de quem estava sendo processado na Lava Jato; em 2017, já aparecia em vídeos ao lado de procuradores responsáveis pela acusação na Lava Jato, demonstrando a postura de que todos juntos defendiam a mesma causa; as matérias recentes divulgadas pelo Intercept confirmam esse modus operandi de atuação engajada como magistrado. Uma postura que confunde acusação com aquele que julga.
- o sistema inquisitório é medieval! O acusador era o mesmo que o Juiz na Santa Inquisição. Esse sistema permite um quadro mental paranoico – a criação de bruxas a serem posteriormente condenadas. Foi o que vimos no Brasil nos anos recentes
- temos um convite formulado ao procurador Dallagnol para o dia 9 de julho, e aguardamos resposta para que ele possa ser ouvido
- gostaria de apresentar algumas perguntas: quando a divulgação das mensagens do Intercept começou, o senhor não negou de pronto a autoria, mas, em seguida, adotou o discurso de que não poderia dizer que aqueles diálogos aconteceram. O senhor mudou de ideia? O senhor diz que foi um “descuido” ter feito sugestão sobre testemunha à Procuradoria no caso Lula? Ou seja, admitiu a autenticidade das mensagens? As mensagens indicam colaboração entre o senhor e o MP durante todo o processo do triplex no Guarujá. O senhor acha que manteve uma distância equivalente entre as partes? Por que o senhor disse “in Fux nós confiamos”?
- Glenn Greenwald disse que nos EUA é impensável um juiz fazer o que Moro fez à frente da Lava Jato. Lá, por muito menos que isso, juízes e promotores perderam os seus cargos
Márcio Jerry (PCdoB-MA):
- os fatos vêm a tona seguidamente e está muito claro, quase incontestável, que houve uma atuação parcial do senhor, uma atuação que não obedeceu ao devido processo legal
- quem o diz são até colegas seus. Juízes, dezenas, escreveram uma carta com um pedido talvez inédito na Ajufe, pedindo o seu desligamento de sócio benemérito
- por que a PF vai atrás de Glenn Greenwald?
- o senhor tenta erguer a Lava Jato como uma proteção contra mal-feitos jurídicos
- não se combate o crime cometendo outros crimes
- o que mais prejudicou a Lava Jato foi justamente a sua atuação ilegal!
- nos diálogos, há uma pessoa do MPF que diz sobre a sua ida para o Ministério: “o nome da Lava Jato não pode ser conpurscado”. É assim que colegas que conviveram com o senhor viram o senhor virar Ministro
Rogério Correia (PT-MG):
- Reinaldo Azevedo disse e provou claramente que o senhor mentiu aos senadores
- a recomendação que o senhor deu ao Dallagnol foi para afastar uma procuradora. E ele afastou!
- ela não era do seu gosto. Tinha que ser mais dura contra o Lula. Isso é papel de juiz ou é crime?
- um procurador disse: “Moro viola sempre o sistema acusatório”.
- o Correio Braziliense foi atrás e um procurador confirmou esse diálogo!
- a Veja foi atrás das testemunhas que foram fraudadas pelo senhor, que indicou ao Dallagnol. E as pessoas confirmaram para a Veja que o mau elemento Dallagnol foi lá!
- o senhor disse que “a pessoa estaria disposta a prestar informação”
- a Folha trouxe o caso do Leo Pinheiro e ficou claro que não tinham provas. Tiraram de 26 anos de cadeia para dois e meio. O procurador Dallagnol disse: “não pode parecer prêmio por denunciar o Lula”. Isso é trivial ou é crime?
- eu sugiro uma CPI para verificar se os diálogos são verdadeiros e para recuperar o celular do Dallagnol
- o senhor não acha que seria o caso de se afastar do caso de ministro?
- o seu Ministério está parado e o país está dividido. O senhor aproveita isso para incentivar manifestações que são contra o Supremo
Erica Kokay (PT-DF):
- Moro disse quando vazou diálogos da Presidenta Dilma e do ex-Presidente Lula: “o problema não era a captação do áudio, mas o conteúdo”. Hoje, mudou o discurso
- é natural indicar testemunhas que foram confirmadas e têm nome e endereço? É natural dizer “agora não podemos investigar tudo”? Também o fez quando investigou o Banestado!
- Moro diz quem que divulga as mensagens quer impedir as investigações. Quem quer impedir as investigações? O que diz que não queria investigar FHC porque ele era aliado?
- não foi só com Léo Pinheiro: foram 283 anos de prisão transformados em menos de 7 anos de prisão!
- isso é rasgar a toga e desmoralizar a Lava Jato e o combate à corrupção!
- estamos vivenciando um absurdo! Condenaram Lula por convicções.
- entre togas rotas, balas e bijouterias de nióbio, o país vive uma farsa!
Resposta de Moro:
- a Lava Jato foi a maior investigação de corrupção da história do país
- sobre as mensagens: houve uma invasão criminosa dos celulares. Esse material eu não tenho mais. Eu saí do Telegram em 2017.
- mas não há nada ali que seja ilícito
- disseram que eu solicitei a troca de uma procuradora: na mensagem divulgada, cuja autenticidade não reconheço, não há pedido de substituição
Professora Rosa Neide (PT-MT):
- o senhor está lameado em sérias denúncias
- fico a pensar: o Estado Democrático de Direito está sendo pelo senhor protegido ao se manter no cargo?
- o senhor, em momento nenhum, manteve a equidistância e a imparcialidade
- cresce o número de pessoas que querem fechar o Congresso, fechar o Supremo… e o senhor muitas vezes aplaudindo
Paulo Pimenta (PT-RS):
- Moro, você será julgado pelo STF!
- o senhor disse que é trivial conversar com advogados e procuradores. Cite cinco advogados com quem o senhor conversou por Telegram. Mostre pelo menos um diálogo que tenha mantido com o Dr Cristiano Zanin [advogado de Lula]. Qual é a sua relação com o advogado Zucolotto? O senhor se reuniu com ele e com a Míriam Leitão? O senhor nega que pediu ao Dallagnol para que ele agilizasse processo contra o Vaccari? O senhor nega reportagem da Veja em que orientou testemunhas ao MPF, que foram procuradas e identificadas pela Veja? O senhor nega que foi convidado para ser ministro antes das eleições? O senhor nega que grampeou escritórios de advocacia da defesa de Lula? O senhor nega que, mesmo sendo juiz de primeira instância, interceptou uma Presidenta da República? )Se fosse nos EUA, já estaria preso há muito tempo…). O senhor nega que, depois, ainda divulgou a interceptação para a TV Globo?
- do meu ponto de vista, o senhor cometeu um conjunto de crimes
- o senhor e Dallagnol montaram um esquema que se transformou num projeto de poder
- faça uma manifestação formal ao Telegram!
- abra mão de todos os seus sigilos, Moro
- não respondo pra miliciano ou criminoso. Não falo com bandido
- onde está o Queiroz?
Resposta de Moro:
- o veículo em questão tem uma narrativa, um sensacionalismo, e quer demonstrar uma tese que ele estabeleceu
- Zucolotto nunca atuou na Lava Jato
- as minhas decisões, boa parte delas, foram mantidas por instâncias superiores
- Léo Pinheiro: ele está preso até hoje. Entendi que ele mereceria benefícios por ter colaborado com a justiça
Talíria Petrone (PSOL-RJ):
- o senhor se considera paladino da moralidade, da justiça, grande defensor do lei… Mas agiu com centralidade em uma investigação e depois virou Ministro do Governo eleito!
PUBLICADO PELO “BLOG CONVERSA AFIADA” ( BRASIL)