Antes completar seis meses, ou o 1º de 8 rounds (cada semestre vale um round no mandato de 4 anos), o governo Bolsonaro já beijou a lona. Não estou falando do vexame de um sargento da FAB fazer tráfico de 39 kgs de cocaína num dos aviões da comitiva presidencial que ia fazer escala na Espanha, a caminho da reunião do G-20, em Tóquio. Detido na Alfândega espanhola, forçou o avião que conduzia o presidente pousar em Portugal para não agravar o incidente. O fato apenas redobra a exigência de vigilância mais rigorosa nas comitivas presidenciais.
Em 1988, estava em Moscou, na era Gorbachev, em viagem pela Andima (que virou Anbima ao se fundir com a Anbid) e soube da boca de um diplomata que integrava a comitiva do presidente José Sarney e hoje é embaixador, que o mesmo (não o presidente) ia aproveitar o carreto para trazer fardas militares e outras recordações históricas do regime soviético que já estava se desmoronando (o que se consumou em 1991). Imagino que outros pequenos e grandes deslizes já tenham ocorrido nessas comitivas.
Também não falo da queda vertiginosa da queda de popularidade do governo Bolsonaro na Pesquisa CNI/Ibope, divulgada quinta-feira, 27. O grau de aprovação entre ótimo e bom (que era de 49% em janeiro), despencou de 35%, na pesquisa de abril, para 32%. Índice que igualou o percentual dos que consideram o governo ruim e péssimo (26% em janeiro e aumento frente aos 31% em abril).
Pior foi a avaliação pessoal do presidente da República. Nada menos que 51% das 2 mil pessoas ouvidas em 126 cidades do país entre os dias 20 e 25 deste mês perderam a confiança em Jair Messias Bolsonaro.
O governo vem dando muita cabeçada e demonstra falta de coordenação política. Originalmente, ela seria exercida pelo ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebiano. Mas esse foi trocado em fevereiro. Desde então, ocorreram várias trocas de peças-chave da estrutura de apoio no Palácio do Planalto e uma dança de cadeiras no ministério da Educação.
A falta de coordenação política e de uma proposta concreta para devolver o crescimento à economia e a confiança nos agentes econômicos e nos consumidores fizeram a confiança no presidente despencar. E não faltaram motivos de ordem prática.
Vale lembrar, mais uma vez o comentário do assessor de Bill Clinton, James Carville, para explicar, em 1992 ao presidente George Bush pai (falecido ano passado) as razões da derrota do presidente que fora aclamado como herói de guerra um ano antes, quando liderou as forças de coalizão do Ocidente para derrotar as tropas de Sadam Hussein na invasão do Kuwait pelo Iraque: “É a economia, estúpido”. Estúpido tem o sentido de idiota, ou bobo, mas a essência era dizer que o galardão de guerra não foi capaz de angariar simpatias quando a economia estava em queda e o desemprego em alta.
É exatamente o que está acontecendo no Brasil nesses primeiros seis meses de governo.
Por falta de um programa para reativar a economia que já vinha em queda desde o 2º semestre do ano passado, devido ao impacto da greve dos caminhoneiros, o próprio governo, que tinha acreditado que a confiança na proposta econômica de Paulo Guedes de “zerar o déficit ainda em 2919” (o déficit primário, ou seja, receitas menos despesas, sem contar os juros da dívida pública), tendo como carro-chefe a reforma da Previdência, reviu nesta quinta-feira, 27, as previsões de março.
O Produto Interno Bruto (PIB), soma de todas as riquezas produzidas no ano deve crescer apenas 0,8%, contra 2% na previsão de março. Vale lembrar que Itaú e Bradesco, os dois maiores bancos privados do país, que mantém departamentos econômicos para se antecipar aos fatos, já haviam previsto o tombo no começo do mês.
Agora que o estrago está feito, o governo está correndo para ampliar a liquidez do sistema financeiro e já insinua que pode baixar os juros básicos (a Taxa Selic, dos atuais 6,50% ao ano, em que estão estacionados desde março de 2018, para 6,25% na reunião do Comitê de Política Monetária dias 30 e 31 de julho). Como até lá a reforma da Previdência dificilmente estará aprovada, na plenitude sonhada por Paulo Guedes, está ficando claro que o Banco Central do Brasil vacilou em não baixar os juros este mês.
E mais ainda em não forçar o cartel bancário a baixar os juros para as empresas, consumidores e famílias, que é o que importa. Como resultado, a previsão de crescimento do consumo das famílias encolheu de 2,2% em março para 1,4% (tombo de 36%). Agora, Paulo Guedes diz que “a liberação de R$ 100 bilhões do compulsório será para expandir o crédito”.
Se não baixar os juros, acompanhando a queda da inflação, de nada adiantará. A inflação anual caminha para a faixa de 3,6% até 2021. Pois essa é a taxa média, mensal, dos juros bancários. Não pode dar certo. Ou pior, só vai aumentar a inadimplência das famílias. Destravar esse nó, para reativar o consumo, era a proposta de Ciro Gomes.
Confiança não enche barriga nem movimenta a economia. Henrique Meirelles usou essa palavra de ordem ao assumir o ministério da Fazenda, em maio de 2016, após o impeachment de Dilma, acusada de pedaladas fiscais, mas condenada pelo ‘conjunto da obra’. Meirelles achava que a confiança iria impulsionar a economia, após a queda de 3,6% em 2015 e novo tombo de 3,3% em 2016.
Um dos impulsos veio do agronegócio, que cresceu 15% em 2017, graças à supersafra (apoiada pelo famoso Plano Safra – jamais entendi porque o PT nunca explorou isso). Depois não se sustentou, porque o “agro não é tudo”, representa menos de 12% do PIB . Cresceu apenas 1,1% em 2017 e 1,1% em 2018. Este ano, quando muito, haverá expansão de 0,8%. E o efeito no emprego, que murchou em maio, já está batendo à porta.
GILBERTO MENEZES CÔRTES ” JORNAL DO BRASIL ” ( BRASIL)